Poema II: O Centro da Cidade


Zé conhecia somente a Vila de Aço
E seus arredores pobres ou baldios
Zé sempre sentiu-se só
Como se a pobreza não fosse vazio suficiente
Mesmo quando se tem fome de pão
Tem-se fome de amor


Mas ele caminhou até ver as luzes
Seus pés descalços queimarem no asfalto pela primeira vez
Tudo bem, já era normal a dor fazer parte das boas vindas
Mas
Como podia esse ar que não fedia
Expirar a essência de doenças e morte
E mesmo assim apesar de tudo
Ser lindo, ainda que dessa forma plástica


A noite caiu como uma garoa fina
Em dias de chuvas acidas
Mas as luzes permaneciam intactas e impermeáveis
E a noite trouxe consigo um ou outro cheiro
Outros tipos de vida
A noite transforma o tédio em serenidade
Zé se encostou a um beco escuro
Ao lado de outros senhores elegantes
Trajando sonhos de época

Suas roupas eram velhas
Como o preconceito das velhas de bem que o encaravam
Com aqueles olhos de pena e desprezo
Sentindo-se maior, melhor, donas de compaixão
Zé tinha uma cinta que só lhe convinha para poder conter a fome
Como um Cérbero envolto a barriga

Era estranho, não importava onde Zé estava
Lá estava o inferno de Zé
Nada cômodo, mas habitual
Mas eis que então um anjo pairou sobre o limbo



Nenhum comentário:

Postar um comentário