Zé conhecia somente a Vila de Aço
E seus arredores pobres ou baldios
Zé sempre sentiu-se só
Como se a pobreza não fosse vazio suficiente
Mesmo quando se tem fome de pão
Tem-se fome de amor
Mas ele caminhou até ver as luzes
Seus pés descalços queimarem no
asfalto pela primeira vez
Tudo bem, já era normal a dor fazer
parte das boas vindas
Mas
Como podia esse ar que não fedia
Expirar a essência de doenças e morte
E mesmo assim apesar de tudo
Ser lindo, ainda que dessa forma
plástica
A noite caiu como uma garoa fina
Em dias de chuvas acidas
Mas as luzes permaneciam intactas e
impermeáveis
E a noite trouxe consigo um ou outro cheiro
Outros tipos de vida
A noite transforma o tédio em
serenidade
Zé se encostou a um beco escuro
Ao lado de outros senhores elegantes
Trajando sonhos de época
Suas roupas eram velhas
Como o preconceito das velhas de bem
que o encaravam
Com aqueles olhos de pena e desprezo
Sentindo-se maior, melhor, donas de
compaixão
Zé tinha uma cinta que só lhe
convinha para poder conter a fome
Como um Cérbero envolto a barriga
Era estranho, não importava onde Zé estava
Lá estava o inferno de Zé
Nada cômodo, mas habitual
Mas eis que então um anjo pairou sobre o limbo
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